Minha mãe me avisou que seria assim... Eu seria desprezada por uma sociedade machista e mesquinha. Mas o que eu podia fazer?
Escritoras não eram bem vistas na sociedade. Talvez esse fosse o motivo.
Eu não sei o que estava pensando quando caminhei decidida até o jornal, naquela manhã fria de setembro. O tipógrafo levou um grande susto ao me ver ali parada, de pé na soleira de sua porta.
Com certeza ele não estava acostumado a ver mulheres naquela saleta. Nenhuma saia-balão, pobre basbaque.
No entanto, lá estava eu. Uma mulher muito a frente de seu tempo, muito decidida. Ajetei o chapéu em minha cabeça e engoli em seco.
Não podia demonstrar nervosismo.
- Eu gostaria de lhe oferecer duas sacolas de ouro em troca da publicação de um poema. Não tenho nenhum tostão em moeda, mas trouxe todas as jóias que eu possuo.
O velho senhor levantou os olhos de sua máquina de escrever.
- Perdão?
Suspirei. Tinha certeza de que o arrependimento não tardaria a chegar. Mas minha vida já estava arruinada de qualquer forma, então não via motivo algum para continuar honrando o nome de minha miserável família, que pretendia me casar a força com um fazendeiro rico e muito mais velho do que eu.
Para princípio de conversa, tinha apenas 16 anos. Não que isso seja importante, dadas as circunstâncias.
- O senhor me ouviu muito bem. O poema se chama "O Amante", e eu espero vê-lo espalhado por todas as ruas de Paris até o Domingo.
O homem pigarreou.
- Devo presumir que a família da senhorita está ciente de sua irrecusável proposta? - Perguntou ele, com os olhos grudados nas duas pequenas sacolas cheias de ouro que pendiam de minhas mãos calçadas em luvas de renda.
Fiz questão de deixá-las bem a mostra. O dinheiro podia estar movendo o mundo, mas as jóias de uma dama ainda eram consideradas um grande investimento no século XIX.
- É claro que sabem. - Eu dei o meu melhor sorriso. - Estamos em 1910, meu caro senhor. É hora de uma revolução.
- A senhorita pretende usar algum tipo de pseudônimo? - Ele perguntou, inclinando-se para mim.
Hesitei.
É claro que o objetivo era exatamente que eu me revelasse. Mostrar o meu nome, para que Arthur soubesse, onde quer que estivesse, que eu não o esperava mais. Já não importava.
Não que fosse ser de grande ajuda. Eu duvidava de seu retorno, para ser sincera... Mas eu precisava ter certeza de que o recado fosse entendido.
Porque seria a última vez que ele ouviria o meu nome.
Ou talvez... talvez eu pudesse apenas insinuá-lo, de uma forma bastante convincente. Algo que ele notasse quando lesse.
Uma marca de minha personalidade, por assim dizer.
O velho senhor ainda me encarava, com seus grandes olhos azuis, por detrás dos óculos grossos e redondos.
- Escreva este nome, caro senhor. Creio que seja o suficiente.
Aproximei-me da mesa e peguei sua pena. Minha mão tremia, o que tornava a letra irregular e borrada.
Não que eu estivesse me importando com a caligrafia naquele momento.
Porém, quando se estuda durante seis anos em um internato na Inglaterra, nos tornamos potencialmente observadoras.
O homem arregalou os olhos ao ver o nome no papel.
- Gaston Leroux? - Ele franziu o rosto, incrédulo.
- É o nome do meu falecido irmão. O meu nome será mantido em segredo, até mesmo para o senhor.
Joguei as duas bolsas em cima de sua pesada mesa de madeira.
- Faça sua parte no acordo.
Virei-me e caminhei até a porta, determinada.
Nada no mundo poderia estragar aquele dia.
Eu havia acabado de fazer a maior loucura (e talvez a única) de minha vida. Mas essa era simplesmente eu: não podia ficar calada e esperar pacientemente pela minha primeira dança, ou por meu casamento, como a cálida moça que fui instruída para me tornar.
Eu era intempestiva, sem paciência, autoritária.
E era por isso que eu estava fugindo dali, naquela noite mesmo. As malas já estavam prontas, o cocheiro já estava pago, a hora estava marcada.
Era um novo começo em minha história.
Abri minha sombrinha de renda azul, enquanto atravessava a rua.
E foi então que ele esbarrou em mim.
Um grande amigo, que mudaria minha vida para sempre.
Continua...
1 freckledmaníacos.:
Mandi, adorei!
Continua, continua!
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